Ligado à área de educação ambiental há mais de 20 anos, o professor e coordenador de projetos ambientais José Bezerra nos relata um pouco da sua experiência e mostra quanto os projetos ambientais podem despertar nos jovens sentimentos para o bom uso e preservação dos recursos naturais.
Em época de efeito estufa e aquecimento global, é comum a mídia explorar atualmente nos seus noticiários relatos apontando a importância da preservação e conscientização dos recursos naturais. Contudo, estes constantes apelos não têm surtido quase nenhuma ou pouca diferença entre a população. E este fenômeno é explicado pelos especialistas como resultado do pouco (para não dizer inexistente) incentivo de práticas de ensino aos jovens e crianças direcionadas ao bom uso e cuidado dos materiais de origem orgânica.
Para falar um pouco mais sobre este assunto e entender o quanto é importante cultivar, desde as mais tenras gerações, o respeito e amor pela natureza, o Empauta UFS conversa com o professor e educador de projetos relacionados ao meio ambiente, José Bezerra.
Empauta UFS: Como surgiu o seu interesse em desenvolver projetos ligados à área ambiental?
José Bezerra: Eu fui criado em fazenda, então sempre fui do mato mesmo, um bicho do mato o tempo todo. Tanto é que quando eu era pequeno tinha um maior problema, porque eu ia para a fazenda e na hora de voltar para casa eu entrava no mato e não saía mais. Pra você ter idéia, era preciso meu pai me pegar à força para irmos embora. Por isso, como sempre gostei de mato, animais, árvores e tudo isso, eu estudei mais a fundo sobre esta área e percebi que poderia manter vínculo com este meio através dos estudos. No colégio Arquidiocesano, eu comecei a lecionar matérias como biologia, química e física e depois de ter passado no vestibular de biologia fui convidado pelo colégio para novamente dar aulas e já estou na escola há mais de 10 anos. Mas, no início, ainda não havia desenvolvido nenhum projeto ambiental concretamente, só fazia, de vez em quando, aulas diferenciais como trilhas na Serra de Itabaiana, em que tive a oportunidade de me aproximar do IBAMA. E desse meu contato com a instituição, surgiu que um dia eu fui indicado por eles a realizar um projeto ambiental na Fazenda Boa Luz que apesar de ser um local muito bonito, paradisíaco, não possuía, naquele momento, nenhuma explicação sobre nada da sua fauna e flora. Então, a direção da fazenda me solicitou um projeto, fiz um trabalho que consistia num estudo aprofundado sobre o meio ambiente daquela região e permaneci por bastante tempo até depois sair de lá.
Empauta UFS: Em sua opinião, de que forma os projetos ambientais podem inserir valores de preservação e consciência ecológica nas crianças?
José Bezerra: De acordo com as reuniões do meio ambiente, não se pode falar em meio ambiente, hoje, sem falar no projeto de educação ambiental. E interessante esta questão, porque até pouco tempo o meio ambiente era algo tão excluído dos jovens. Eles somente ouviam falar sobre isso, mas não existia uma prática, um contato. E nós sabemos que quando a gente não conhece ou convive próximo de alguma coisa, acabamos dando pouca importância para esta coisa. Nós jamais iremos defender algo que a gente não goste ou não conheça. Por isso, acredito que a educação ambiental é algo primordial, imperativo, extremamente necessário para a formação dos jovens. Tanto a educação ambiental formal inserida no âmbito interdisciplinar ou multidisciplinar da escola, como a educação ambiental informal focada no desenvolvimento de atividades ligadas à comunidade em geral.
Empauta UFS: Conte-nos como eram as atividades dos projetos pedagógicos ambientais em que o senhor coordenou?
José Bezerra: No colégio Arquidiocesano eu vinha desenvolvendo um trabalho de educação ambiental de forma individual, levando os alunos para fazerem as revisões do vestibular ou trilhas na Serra de Itabaiana. Havia um incentivo da escola, mas ainda era algo um pouco restrito. Só depois dos projetos desenvolvidos na Boa Luz como o Vale dos Dinossauros e o Mundo dos Insetos e a sua repercussão tanto dentro do estado e até nacionalmente através das reportagens do jornal O Globo e do programa da Xuxa, foi possível chamar a atenção da coordenação do colégio e eles me fizeram um convite para montar um projeto utilizando o espaço de um terreno baldio, vizinho ao Arquifarolândia, e que só era usado como depósito de lixo. Foi desta iniciativa que nasceu o Projeto Cheirinho do Mato, pioneiro no estado no desenvolvimento de atividades ligadas à área de educação ambiental.
Empauta UFS: Como foi a recepção desses projetos pelas crianças?
José Bezerra: Na Boa Luz, durante o tempo em que estive por lá, foram recebidos mais de 12.000 mil alunos provenientes de escolas públicas e particulares que agendavam visitas com a duração de um dia para uma vivência ecológica ou um acampamento ecológico durante o fim de semana. E eram diversas atividades que desenvolvíamos neste passeio, os alunos realmente tinham um contato direto com a natureza. Engraçado foi uma vez que o pessoal da Boa Luz pediu para que eu levasse cobras para o acampamento (risos) e isso assustava um pouquinho o pessoal, mas eles gostavam muito. E também com os projetos do colégio Arquidiocesano em que eu fazia revisões do vestibular ou aulas sobre botânica na Serra de Itabaiana, eu notava muita empolgação por parte dos alunos.
Empauta UFS: Depois da implantação destes projetos no meio escolar, houve alguma melhora ou mudança de atitude das crianças quanto ao uso dos recursos naturais?
José Bezerra: Ah! Sim, com certeza. É como já tinha dito antes: a prática, o contato com o meio ambiente e os recursos naturais transforma qualquer pessoa. Inclusive, os jovens que ainda estão em um processo de formação da personalidade e do seu caráter.
Empauta UFS: Após a escola particular ao qual o senhor estar coordenado os projetos ambientais ter recebido o prêmio socioambiental brasileiro, o senhor acredita que houve uma maior procura das instituições de ensino privada para a inserção dentro do seu espaço escolar de projetos ligados à educação ambiental?
José Bezerra: Com relação à implantação de projetos fixos e contínuos, ainda é pouca a procura das escolas particulares por este tipo de atividade. De vez em quando, sou convidado por uma instituição a participar de palestras e discussões sobre assuntos ligados ao meio ambiente, mas nada muito além disso. Sinto um interesse maior, com relação a estes projetos, por parte das escolas públicas tanto da capital quanto do interior do Estado.
Empauta UFS: Acredita que há um incentivo das autoridades governamentais para o desenvolvimento de projetos ligados ao meio ambiente dentro das escolas públicas?
José Bezerra: Não vejo muito incentivo das autoridades governamentais com relação ao desenvolvimento de projetos ambientais. Na verdade, muito do meu trabalho e de outras pessoas engajadas também neste meio é realizar mobilizações com nossos contatos da área política e empresarial para desenvolverem leis a partir das necessidades que enfrentamos na prática durante a nossa luta de preservação da natureza. Afinal, mediante uma situação errada você pode até brigar e surtir um efeito naquele momento, mas para que ocorra uma real mudança daquele fato é necessário realizar a implantação de leis ou medidas eficazes por parte de vereadores, deputados, outras instâncias governamentais e até mesmo o ministério público juntamente com a polícia ambiental.
Empauta UFS: Atualmente, o senhor está coordenado alguma atividade ecológica? O que ela consiste?
José Bezerra: Atualmente continuo coordenando o projeto Cheirinho do Mato que é um laboratório ao ar livre com 7.000 m² e composto por um moinho de vento, uma horta com oito canteiros, uma farmácia viva de plantas medicinais de diversas espécies, um minhocário (cultivo de minhocas), uma oficina de reciclagem que trabalha com plástico e metal, um pequeno zoológico com coelhos, patos, marrecos, pavão e até animais silvestres como jabutis que conseguimos mediante autorização do IBAMA. Além disso, coordeno o projeto ambiental do Yázigi Internexus Aracaju, que este ano conta com o grande projeto de educação ambiental Ecoefficiency voltado para a prática de preservação e conscientização dos recursos naturais por meio de simples mudanças de hábitos de consumo.
Empauta UFS: Em sua opinião, o sistema de ensino vigorado hoje no Brasil dá um bom suporte para o desenvolvimento de projetos educacionais ligados ao meio ambiente?
José Bezerra: Mesmo apresentando semelhante necessidade do que as escolas particulares, as escolas públicas possuem programas voltados para a educação ambiental de forma ainda muita tímida. Os alunos até demonstram uma boa receptividade a estes projetos. Já tive a oportunidade de levar ao projeto Cheirinho do Mato, alunos da escola pública desde o ensino infantil até o ensino médio e sinto que eles ficam muito contentes ao terem contato com a natureza. Acredito que só com o crescimento das políticas de educação ambiental nos municípios e estado é que será possível levar adiante estes projetos ambientais para o ensino público brasileiro.
Empauta UFS: Agora com relação aos docentes, o senhor acha que eles estãopreparados para serem educadores ambientais?
José Bezerra: Os professores estão sedentos de informação. Eles estão, sim, preparados. Mas a estrutura atual da educação brasileira não dá suporte para que o corpo docente se envolva e queira realmente levar adiante algum projeto educacional voltado ao meio ambiente.
Fonte: UFS
O Projeto de Educação Ambiental“Click Trilha”, busca promover uma maior interação dos participantes com a natureza, tirando-os de sua rotina urbana e vivenciando com eles a natureza de perto. Enquanto percorrem as trilhas, fotografam a fauna e a flora da região e são sensibilizados em relação aos problemas ambientais, o que promove uma mudança de comportamento tornando-os mais responsáveis pela preservação do meio ambiente.